ONG não prestou contas de meio bilhão para índios

Responsável por gerir profissionais em 19 dos 34 distritos de saúde indígena do Brasil em troca de milhões do Ministério da Saúde, a Missão Guarani Caiuá, entidade de Mato Grosso do Sul ligada a Igrejas Presbiterianas (do Brasil e independente), é suspeita de contratar funcionários fantasmas. Relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), de 2017, aponta indícios da ilegalidade.

Conforme levantamento da reportagem do Correio do Estado, com dados do Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União, entre 2013 e 2018 a entidade recebeu pelo menos R$ 550,7 milhões provenientes de sete convênios com o governo federal na gestão dos Departamento Sanitário Especial Indígena (Dsei), unidade gestora descentralizada do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SasiSUS). Apesar de encerradas, as parcerias não tiveram as prestações de contas encaminhada por completo ao ministério.

O relatório do TCU, relativo a fiscalizações feitas entre os anos de 2014 e 2015, aponta que nestes dois anos foram destinados R$ 1,36 bilhão à três instituições não governamentais para gerir saúde indígena no Brasil.  Além da Missão Evangélica Caiuá, também receberam recursos a Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM), em São Paulo (SP); e o  Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (IMIP), em Recife (PE).

Somadas, as três entidades chegaram a contratar 15.319 profissionais durante os dois anos que foram abrangidos pela fiscalização. Dessas contratações, constataram-se 1.398 indícios de acumulação de vínculos trabalhistas com carga horária incompatível com aquela que o TCU considera como máxima possível, que é de 60 horas semanais. Conforme o relatório, muitos profissionais acumulavam o cargo com outros de instituições públicas e, considerando que atuação nas ONGs exige muitas vezes visitas às aldeias, jornadas tão pesadas seriam “incompatíveis com as atividades a serem realizadas no âmbito do SasiSUS”.

APURAÇÕES

Representante do Conselho do Terena de Mato Grosso do Sul e coordenador-executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apip), Lindomar Terena enfatiza que, anos atrás, o movimento indígena chegou a denunciar a Missão Caiuá ao Ministério Público Federal (MPF) por suspeita de a entidade financiar funcionários fantasmas em cargos do alto escalão. “É evidente que há ONGs com as que trabalhamos bem, mas também tem outras que têm condutas que desaprovamos”, afirma.

Em consulta processual ao banco de dados do MPF, em nome da Missão Evangélica Caiuá, foi encontrado apenas um auto judicial, uma recomendação e um termo de ajustamento de conduta. Nenhum deles era referente a apurações relacionadas a cargos fantasmas. O MPF não respondeu aos questionamentos da reportagem sobre inquéritos relacionadas a ONG.

Conforme o presidente da Missão Evangélica Caiuá, Silas de Souza da Silva, a entidade mantém atualmente 19 convênios com o governo federal no País e atua na contratação de profissionais para atuar na atenção básica de reservas e aldeias indígenas.

Diante dos questionamentos do ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, na última semana, sobre os repasses milionários à entidade nos últimos anos, Silas explica que a missão tenta agendar encontro com o novo gestor. “Queremos esclarecer situações que são um pouco controversas”. O presidente não respondeu a outros questionamentos feitos pela reportagem.

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